Liberdade - essa palavra que o sonho humano alimenta: que não há ninguém que explique, e ninguém que não entenda!
Ghandi e Sócrates são dois personagens que ilustram, do ponto de vista cristão, a ação de Deus que ultrapassa quaisquer fronteiras visíveis da Igreja: um pacifista e um sábio politeístas, cujas vidas e ideias testemunham princípios e valores que coincidem muito com princípios e valores cristãos. Pagãos que, apesar disto, podem facilmente ser chamados de "cristãos na prática" - pelo menos para efeitos ilustrativos.
Aí lemos no evangelho de hoje que "quem ouve estas minhas palavras [as de Cristo] e as põe em prática é como um homem prudente, que construiu sua casa sobre a rocha." (Mt 7,24) e imaginamos que pessoas como Ghandi e Sócrates construíram suas casas sobre a rocha. E poderíamos pensar que basta ser gente boa e corajosa como os dois grandes nomes.
Mas sem desmerecê-los e nem à ação invisível de Deus fora dos limites (visíveis) da Igreja, nobres pessoas cuja prática coincida com as palavras de Cristo podem até servir, entre outras funções, como um puxão de orelha aos cristãos ("tem pagão que é mais cristão que os que vão à igreja!!!!"), mas não são fontes de inspiração para os cristãos.
Pois neste evangelho, em que Cristo pede que traduzamos suas palavras em prática, ele também pede, indiretamente, que o ouçamos antes de praticá-las.
Ele exemplifica duas situações que ilustram o significado das relações entre ouvir e praticar: na primeira, quem ouve suas palavras e as pratica foi identificado com quem construiu sua casa sobre a rocha, um fundamento firme e estável, enquanto que quem ouve sem praticar se identifica com quem construiu sua casa sobre a areia, que não sustenta nem um puxão mais forte.
Muitas vezes podemos concluir que a fé em Deus resulta - ou deve resultar - em uma prática cristã, o que é uma conclusão correta, mas parece que aqui aparece um elemento novo nesta relação entre fé (as palavras de Cristo) e prática: está fundamenta aquela. Então este "sistema" fé-prática parece se estruturar como a fé sendo a precursora de uma determinada prática, e uma prática que estabiliza e sustenta a fé.
A prática das palavras de Cristo é mais do que um resultado, uma consequência: ela é também os muros da cidade fortificada mencionada por Isaías (Is 26,1) que protegem a fé. Se é verdade que a fé é mais importante que a prática, também é verdade que sem a prática a fé se esvai como a casa construída sobre a areia.
Pessoas como Ghandi e Sócrates podem até estar sobre uma rocha mais firme do que muitos cristãos, mas é como se vivessem sobre esta rocha à mercê do tempo, desabrigados sobre um firme piso nú sem sentido. Entre eles e aqueles que dizem "Senhor, Senhor" mas não praticam o que Cristo disse, devem se posicionar os cristãos, lembrando-se de fundamentar bem a sua fé com a prática - e também de oferecerem a casa que são as palavras de Cristo, tanto aos que vivem sobre uma rocha nua, quanto aos que vivem sobre a areia, abrigados ou não.