Divagar divagarinho

Liberdade - essa palavra que o sonho humano alimenta: que não há ninguém que explique, e ninguém que não entenda!
Visite:  ||  Instituto Humanitas Unisinos - IHU.  ||  Religión Digital  ||  Site do Vaticano  ||  Agencia Informativa Latinoamericana S.A.  ||  Radio Reloj  || 
Creative Commons License Powered by Blogger

Arquivo de postagens: dezembro 2006   janeiro 2007   fevereiro 2007   março 2007   abril 2007   maio 2007   junho 2007   julho 2007   agosto 2007   setembro 2007   outubro 2007   novembro 2007   dezembro 2007   janeiro 2008   fevereiro 2008   março 2008   abril 2008   junho 2008   julho 2008   agosto 2008   setembro 2008   outubro 2008   novembro 2008   fevereiro 2009   abril 2009   maio 2009   fevereiro 2011   março 2011   junho 2011   março 2017   abril 2017   maio 2017   junho 2017   outubro 2017   abril 2018   agosto 2018   setembro 2018   janeiro 2019   abril 2019   maio 2019   junho 2019   setembro 2019   novembro 2019   dezembro 2019   janeiro 2020   fevereiro 2020   julho 2020   agosto 2020   setembro 2020   outubro 2020  



30 de agosto de 2008

 

Coisas que eu não entendo

Quando prenderam o tal Daniel Dantas - o banqueiro, não o ator - o cara conseguiu dois mandatos de sei-lá-o-quê para não ficar preso em questão de horas. Quem deu esse presentão foi tal do ministro Gilmar Mendes (que é presidente do STF - não era a Ellen Gracie???)
Se o cara - o ministro - não é corrupoto, gente boa também não é, porque se a suspeita fosse sobre mim ou você, ele não ia facilitar tanto assim a nossa vida - ou será que ia? De qualquer modo, eu, quando ando na rua, tenho que andar com um olho nos bandidos e o outro nos policiais, quer eu esteja fazendo algo ilegal, quer não - e não vem ministro nenhum garantir nada para mim.

Até aí, tudo bem - é uma lei informal que a sua proteção estatal é proporcional à sua riqueza.

Mas aí ver em quase toda a mídia o Gilmar Mendes ser pouco a pouco transformado em herói, porque luta contra o nepotismo, porque quer reformar não sei o quê, porque colocaram uma escuta na sala dele - quando qualquer um envolvido com algum criminoso ou suspeito está sujeito a isso - e porque ele está sofrendo com o estado policialesco, é nojento!! Eu sofro tanto pelo excesso de policiamento - porque se eu sair sem minha carteira de identidade vou direto para a cadeira - quanto pela falta de policiamento - porque aqui no centro da cidade tem brigadiano saindo pelo ladrão (sem trocadilho), enquanto que basta você se deslocar 1km do centro e você só encontra os bandidos gozando da segurança de que não vão encontrar a polícia ali. Quem sofre com o estado policialesco sou eu!! Vá ver se o pobre coitado do ministro não pode usufruir das vantagens da democracia mais do que eu - tais como ir e vir (porque eu só consigo ir e vir até onde minhas pernas alcançam, afinal o ônibus está caro e a carteira de motorista também), acesso à alimentação decente (quem me garante isso é minha mãe, e não a democracia) e educação (quem me garante isso é a briga semestral com a universidade para que eu possa fazer menos cadeiras do que o mínimo permitido). O problema não é a democracia, é gente se sentindo ofendida em cadeia nacional com coisas que a ralé que não é ministra de nada convive diariamente sem que o JN venha fazer uma reportagem.

Eu, quando me sinto amedrontado pelo sistema, posso no máximo fumar um cigarro de preocupação. Porque uma besta dessas não pega vai ler um livro ou fazer ioga e pára de chorar para o William Boner que está sendo perseguido.
Ah, é! Ele faz isso porque é um servidor público que trabalha para garantir a minha liberdade, tinha esquecido dessa sua nobreza de espírito.

 

Resoluções para Setembro

Todas as pessoas costumam fazer resoluções de ano-novo. Mas porque não se faz resoluções, também, de semana nova (além da dieta, claro), de nova fase da lua, de quinzena nova, semestre novo, dia novo, etc?
Eu, no momento, vou fazer minhas resoluções de mês novo. Dependendo, as mantenho para os próximos meses:

a) vou dedicar mais tempo para estudar, ler, ouvir música, descansar e comer com calma e sem pressa - quer dizer, dedicar mais tempo a mim. É incrível como uma pessoa pode dedicar tanto tempo aos outros em detrimento de tempo para si. Tem aqueles tempos que você não pode determinar: horas de trabalho, horas de sala de aula, horas de deslocamento, etc. Mas dá para dedicar menos tempo a coisas que têm menor retorno.
As horas que eu dedico a gastar dinheiro: para gastar menos dinheiro, eu acabo gastando tempo demais pesquisando preço mais barato, indo mais longe - geralmente a pé - para comprar mais barato, calculando quanto dinheiro eu tenho, quanto custa o que eu quero, se vale a pena gastar ou não com aquilo, etc; na dúvida, não levo e deu. Porque, de qualquer maneira, eu entro sempre no cheque especial no fim do mês e o vale-refeição acaba antes que eu termine de comer. Então, menos tempo dedicado a gastar dinheiro.
Tem também as horas que eu dedico aos outros: quebrar um galho aqui, ouvir um problema ali, visitar algém mais para lá, essas coisas. Eu não me dedico às pessoas de quem eu gosto esperando retorno - infelizmente, eu tenho o costume de pressupor que, assim como eu faço algo por alguém só porque gosto da pessoa, a pessoa fará o mesmo por mim. Ou é um problema de erro de julgamento meu, ou então as pessoas são assim, tal como eu, mas não gostam tanto assim de mim, não sei. Sei apenas que quando eu preciso, não encontro ninguém. Então, em vez de tentar contribuir para com as necessidades dos meus amigos, vou contribuir mais para com a minha necessidade. Não que eu não queira o bem das pessoas, pelo contrário: mas vou ficar só no "boa sorte".

b) vou dormir e acordar cedo durante a semana, e dormir e acordar tarde nos fins de semana. Porque eu tenho feito o contrário: chego sempre em cima da hora no trabalho, e aproveito as maravilhosas manhãs do fim de semana. Está errado isso. Tudo errado.

c) vou parar de ser legal gratuitamente com os outros. Porque só eu faço isso e isso dá trabalho. É mais fácil mandar todo mundo se fuder por padrão e ser excepcionalmente legal só em certos casos. Cansei de me desgastar para ser legal por padrão e só mandar se fuder excepcionalmente em certos casos. Isso se chama "ligar o foda-se".

d) vou escrever mais. Acho que é a resolução para Setembro mais simples que fiz.

14 de agosto de 2008

 

limite

De todas as pessoas no mundo, existem as que eu conheço. De todas as que eu conheço, existem as que tem alguma relação maior comigo, coisas em comum como morar na mesma cidade, trabalhar no mesmo lugar, compartilhar os mesmos interesses, essas coisas. De todas estas últimas, há algumas com quem eu convivo mais, seja por obrigação, seja por gosto.

Desse afunilamento, desde o mundo inteiro até as pessoas com quem eu convivo, eu precisava conviver com as pessoas, com o tipo de pessoas mais nocivo a mim? Eu precisava viver com o tipo de pessoas mais intolerante, mais formatada, mais tosca, mais centrada em si mesma, mais mesquinha, mais arrogante, mais distante de mim?

Poderia ser pior? Poderia: eu podia viver em um lugar onde eu fosse explorado sexualmente, economicamente, ou poderia viver em meio a tiroteios constantes, ou sem saneamento básico, qualquer desses horrores a que muitas pessoas estão sujeitas. Mas só porque poderia ser pior não quer dizer que não seja horrível e insuportável!!!

Eu nunca desisti de fazer as coisas com as quais eu sonho. Já desisti de muitas coisas, e muitos sonhos eu nem comecei porque não via perspectivas concretas de realizar no momento. Mas dos sonhos que eu comecei, eu nunca desisti e fui até o fim, nem que fosse apenas para terminar, mesmo que fosse mal terminado.

Eu já abri mão de muitas coisas na vida. Já me joguei no lixo inúmeras vezes. Mas de certos aspectos, de certas coisas minhas eu nunca abri mão. Eu não sei se talvez meu erro seja preservar uma ou duas coisas intocáveis, quando deveria, na verdade, abrir mão de tudo e me deixar levar, apostar e ver no que dá de maneira absoluta.

Às vezes é necessário desistir de certos projetos. Mas a minha única saída, a única perspectiva à minha disposição é desistir de projetar, de ter perspectivas, de sair do mesmo lugar em que eu me encontro.

Eu já não sou a mesma pessoa que era quando eu tinha, sei lá, 10, 14 e mesmo 20 anos. Mas mesmo com todas essas mudanças, eu continuo sempre e sempre à mercê exatamente das mesmas coisas a que sempre estive à mercê. É como se livrar-se desse horror fosse um trabalho de Sísifo. Mas não é a pedra, e sim eu que sempre rolo montanha abaixo, para recomeçar tudo novamente.

E a cada dia que passa a pedra se torna mais e mais pesada.

 

Quebra-galho

Isso não é uma avaliação sobre a maneira como as pessoas agem para comigo, pelo menos não necessariamente, mas sim uma avaliação sobre a maneira como eu enxergo as ações das pessoas.

A impressão que eu tenho é que as pessoas se aproximam mais de mim quando estão em uma fase ruim, e se afastam quando estão bem. Como se o único interesse que eu possa causar seja o de ser um ombro amigo para quando se está mal, e, depois, quando a pessoa está bem (não que eu tenha sido o que fez com que a pessoa melhorasse), vai se divertir e ser feliz com quem realmente interessa.

Eu não sou a pessoa a ser procurada para compartilhar coisas boas (não que ninguém compartilhe coisas boas comigo, eu acho), mas sim para compartilhar as desgraças da vida, para servir de apoio.

Sei lá, é ruim você descobrir que é uma pessoa exclusivamente temporária na vida das outras.

 

...

Eu não deveria ser tão sensível. É tão patético da minha parte...

13 de agosto de 2008

 

Urgência e tamanho

Não existem pessoas com problemas maiores do que os meus. Eu detesto quando eu me arrisco a contar quais são os meus problemas, e tenho que ouvir que tem coisa pior no mundo, imagina os doentes, ou as pessoas sem comida na África, etc, estes sim têm problemas...

Primeiro, há uma diferença entre tamanho e urgência dos problemas.
O tamanho de um problema é geralmente relativo à própria pessoa. Um mesmo problema por ter proporções muito diferentes para uma e para outra pessoa. E, geralmente, os problemas mais toscos não são às vezes capazes de ser resolvidos porque há algum problema maior e anterior que precisa ser resolvido - o que não torna certas pessoas menos chatas.
A urgência do problema é outra coisa. Eu estou aqui, me sentindo mal, abandonado, sofrendo, etc, e que ninguém venha me dizer que isso não é nada! Mas concordo que não é um problema tão urgente quanto uma pessoa passando fome, ou uma pessoa que perdeu alguém que ama, por exemplo. Se as pessoas falassem em uma hierarquia de urgência, tudo bem. Mas meus problemas são sempre "probleminhas".

Segundo, mesmo que eu aceitasse a idéia de que existem problemas maiores e problemas menores, ainda assim isso não deveria servir como redução dos meus problemas. Isso - essa idéia de que o probleminha de alguém não é nada comparado com o problemão de outra pessoa - às vezes (e eu disse às vezes) é sinal de que uma pessoa está com problemas, e vê outra com um problema "maior", fica feliz e consolada porque tem alguém pior - ou seja, se contenta com a desgraça alheia. De qualquer maneira, o fato de outra pessoa ter um problema "maior" não diminui nem resolve o meu problema, e não me serve de estímulo para ignorá-lo. Mas não existe isso de problemas maiores ou menores. Existem problemas mais urgentes e menos urgentes. E o fato de haverem pessoas com problemas mais urgentes do que o meu não invalida os meus próprios problemas. É uma constatação triste a existência de pessoas com problemas mais urgentes que os meus, mas é uma constatação igualmente inútil tanto para mim com meus problemas menos urgentes, quanto para as outras pessoas com problemas mais urgentes. O fato de eu dar atenção aos meus problemas menos urgentes não significa que eu não dê bola para os problemas mais urgentes dos outros - significa apenas que eu também tenho meus problemas.

Eu não quero, com isso, "elogiar" o sofrimento menor. Só quero mostrar que um problema é sempe um problema, e os problemas alheios não resolvem os meus; e também que o tamanho de um problema é uma medida pessoal, somente a urgência deveria ser levada em conta.

12 de agosto de 2008

 

Cada qual

Acho que meu problema é sobrevalorizar e universalizar o amor. Há tantas coisas que são acessíveis a outras pessoas e a mim não, assim como há coisas inacessíveis a outras pessoas que são acessíveis a, dentre outras pesssoas, eu.
Talvez isso de amor, de alguém intressar-se, não seja para mim. Talvez haja outro caminho, sei lá, que não inclua alguém ter interesse por mim. Claro, a Receita Federal se interessa pelo meu CPF, as Lojas Americanas pelo meu dinheiro, meus amigos por saber que estou vivo. Mas amor, essa coisa toda de alguém se encantar comigo, não há. Para mim.
Nem tudo o que vale para as outras pessoas vale necessariamente para mim. Simples desse jeito.

9 de agosto de 2008

 

Afecção nº 5

"O desprezo (Contemptus) é a imaginação de uma coisa qualquer, imaginação que toca de tal modo pouco a alma que a alma é conduzida, pela presença desta coisa, a imaginar antes o que nela não existe que o que existe..." (Spinoza: Ética, Livro III, Definições das afecções, definição V)

Eu tenho crises de vez em quando. Nada patológico, ou orgânico, ou que seja resolvido com uma boa e velha receita médica, de qualquer modo. São crises emocionais, psicológicas, desse tipo de crises.

Geralmente ocorrem por conta de uma debilidade emocional minha. Quer dizer, se trata de uma incapacidade, naquele momento, de reagir emocionalmente a emoções prejudiciais, como sensação de opressão, de falta de autoestima, falta de perspectiva (desespero, mas moderado), coisas assim. Geralmente essas reações emocionais envolvem não deixar que as emoções mais convenientes sejam sobrepujadas pelas prejudiciais, o que me permite reagir, com alguma ação, contra o que me oprime, ou que me desespera, ou que desvaloriza, ou sub-valoriza, etc. Por isso, eu acho esses momentos de crise semelhante a uma AIDS emocional. Uma imuno-deficiência emocional que, por si só, não causa maiores danos (causa danos, mas reparáveis), mas que debilita minha capacidade de reagir, de me revoltar, de me colocar, essas reações que se tem frente a um ataque alheio. Digo isso considerando que essa situação nem se compara à AIDS, que, por mais tratamento que já possua, ainda assim é sério.

O HIV dessa AIDS emocional é o desprezo. Mas ao contrário do HIV original, este HIV emocional necessita de uma certa colaboração minha para ter forças.

Eu sempre tive problemas com o desprezo alheio. Durante um certo tempo da minha vida, eu me vi sempre sob a perspectiva alheia: se me aceitam, valho alguma coisa, e se não me aceitam, não valho nada, porque eu era tão valioso quanto as outras pessoas julgavam que eu era.
Por algum motivo, eu sofro uma disposição a ser ignorado maior do que a média sofre. Assim, como eu me valorizava segundo o valor que davam para mim, mais essa minha facilidade em ser ignorado, o resultado era um auto-desprezo muito grande. Eu não sei se é a mesma coisa do que uma baixa autoestima, porque uma pessoa com baixa autoestima está convencida de que não vale nada; mas o meu caso era de me valorizar segundo o valor que me davam - quer dizer que hoje eu poderia não valer nada, e amanhã, tudo. Uma pessoa com baixa autoestima ainda afirma alguma coisa de si - afirma que não vale nada - (ainda que afirme algo prejudicial); eu, minha única afirmação era "vocês é que contam", ou "o que eu valho é o que vocês dizem que eu valho", como uma ação na bolsa de valores ou um litro de leite em uma prateleira de supermercado, que não possuem valores próprios, mas somente os atribuídos pela lei de oferta e procura exclusivamente, no caso das ações, e pela margem de lucro definida pelo supermercado mais a lei de oferta e procura, no caso do leite. A minha afirmação era de que eu não poderia afirmar nada, só ser afirmado.
O desprezo alheio, portanto, tinha uma força muito grande sobre mim porque eu já me auto-desprezava de antemão, e esse auto-desprezo tanto favorece o desprezo alheio quanto qualquer outra ação alheia sobre mim. Eu não era algo em si (ou em mim), mas algo nos outros. É diferente de um parasita, que depende do hospedeiro para se manter; é mais um caso de um corpo inanimado que depende do ânimo alheio para ter vida, como um boneco de ventríloquo, um fantoche ou um verbo transitivo, ou então um caso de comensalismo, quando um indivíduo tira proveito de outro sem, no entanto, prejudicá-lo - como uma orquídea, que quando não tem acesso ao sol, trepa em outra árvore para ficar mais alta, mas não prejudica a árvore onde trepou; é diferente também de uma simbiose, onde os dois indivíduos se beneficiam.

Aí, depois de muito drama e sofrimento, aprendi a me auto-valorizar. Claro que a estima alheia sempre vem bem, e desprezo sempre vem mal, mas não vivia mais da estima alheia e não morria mais por causa do desprezo alheio.

Ocorre que esse HIV emocional (o auto-desprezo, o comensalismo emocional), tal como o HIV original, é passível de tratamento, mas não de cura. A consequência é que está sempre à espreita, não é eliminado. Mas habitualmente aprendi a mantê-lo em seu lugar.

Somente em momentos de crise é que esse HIV emocional ganha forças, e eu sinto como se realmente eu não valesse nada, especialmente quando certas frentes de combate não oferecem, de maneira alguma, um cessar-fogo devido à crise (uma observação especial às minhas chefes no trabalho que baixaram as armas nesse momento, o que me deixou na insólita e nunca ocorrida situação de me sentir melhor no trabalho do que em casa).

A debilidade emocional, a crise, os momentos de crise mais forte, ocorrem de uma maneira que ainda não sei identificar: um cansaço emocional, um momento de fraqueza que oportuniza uma devastação emocional, um conjunto de muitas situações adversas que acabam me vencendo naquele momento, eu não sei ainda.

Mas para isso que serve aquela concepção de desprezo descrita por Spinoza na sua Ética: se o desprezo é quando alguém, ao me ver, percebe mais o que eu não tenho (ou não sou) do que o que tenho, o auto-desprezo é quando eu somente vejo o que eu não tenho - e a maneira de combater isso é descobrir, e mesmo criar, se necessário, eu.

 

Tempos Modernos

Intérprete: Marisa Monte
Composição: Lulu Santos


Eu vejo a vida melhor no futuro
Eu vejo isso por cima do muro
de hipocrisia que insiste em nos rodear

Eu vejo a vida mais farta e clara
Repleta de toda a satisfação
Que se tem direito
Do firmamento ao chão

Eu quero crer no amor numa boa
E que isso valha prá qualquer pessoa
Que realizar a força que tem uma paixão

Eu vejo um novo começo de era
De gente fina, elegante e sincera
Com habilidade pra dizer mais sim do que não

Hoje o tempo voa amor
Escorre pelas mãos
Mesmo sem se sentir

E não há tempo que volte amor
Vamos viver tudo o que há prá viver
Vamos nos permitir

3 de agosto de 2008

 

Preconceito reverso

Eu tenho, como qualquer pessoa, meus preconceitos. São vários: contra pessoas de uma cidade vizinha à minha, por exemplo, que me dão a impressão de serem todos gente tosca e horrível - apesar de já ter conhecido uma pessoa maravilhosa de lá; contra pessoas exageradamente homofóbicas, as quais eu sempre suponho que o exagero esconde uma homossexualidade reprimida - não que eu pense que toda a homofobia seja fruto do recalque da própria sexualidade, mas sempre suponho que exageros inflamados sejam recalque; contra machistas, nos quais sempre julgo haver algum complexo de inferioridade; etc.
São preconceitos porque as pessoas da minha cidade vizinha não são todas necessariamente toscas, nem todos os exageradamente homofóbicos serão necessariamente homossexuais recalcados e nem todos os machistas são necessariamente pessoas com complexo de inferioridade ("pessoas" porque existem também mulheres machistas, e também acho, preconceituosamente, que sejam casos de complexo de inferioridade). Claro que eu digo isso somente de maneira politicamente correta, porque não é o que eu sinto - sei, por exemplo, que as pessoas da cidade vizinha não são todas toscas, mas sinto o contrário. Tenho que trabalhar essas coisas, enfim.

Outro preconceito, que tenho que trabalhar de maneira mais urgente, é o de replicar preconceitos que eu já sofri sobre uma generalização das pessoas que me fizeram sofrer este preconceito. Assim:

Quando eu era "dimenor", eu era meio maluquete. Eu era pré-adolescente e pensava que estaria fazendo a revolução usando all-star, por exemplo. Corrigindo, então, eu pensava que era maluquete, mas era um pré-adolescente como qualquer pré-adolescente - que maximiza tudo o que faz de uma maneira quase infinita. De qualquer maneira, era muito escanteado pelas (então classificadas como) pessoas de bem: que eram meus colegas, com suas respectivas famílias, que não gostavam das minhas atitudes, dos amigos maconheiros, vileiros e marginais que eu tinha. Não que todos fossem realmente vileiros, maconheiros e marginais, mas quaisquer outros grupos em que se enquadrassem eram objeto de repulsa por parte das pessoas de bem; só menciono esses três porque são exemplos de pessoas que costumam causar repulsa, ainda, em muita gente. E minha cidade é uma cidade de pessoas de bem ("pessoas de bem" não é o mesmo que pessoas do bem, só para deixar claro).

Então, haviam pessoas com características semelhantes entre si que me hostilizavam, me rotulavam e o faziam ou pelas minhas atitudes ou, na falta delas, o faziam por causa das roupas que eu vestia, das pessoas com quem andava ou das idéias que eu expressava. Quer dizer, porque eu matava aula eu era uma má influência, porque eu andava com maconheiros eu fumava maconha, porque eu fumava maconha eu era, novamente, má influência, enfim.
Acho que um preconceito parte de uma generalização. Você vê um indivíduo ou um grupo de indivíduos com determinadas características, e supõe que outros indivíduos, que possuam algumas características semelhantes, certamente irão apresentar as outras características que vocêo viu naquele primeiro grupo de indivíduos. Generalizar é você supor que alguma ou algumas características pressuponham necessariamente outras características, mesmo que você não tenha visto estas outras características. No meu caso, por exemplo, a característica de matar aulas levava as pessoas a acreditarem que eu faria com que os outros fossem matar aulas, porque pensavam que toda pessoa que mata aulas leva outras pessoas a matar aulas; ou a característica de andar sempre com maconheiros em volta levava as pessoas a acreditarem que eu fumava também (e isso que só fui fumar maconha depois dos vinte anos, e maconha aliás é muito bom, mas também não é bicho: não trocaria um chocolate, uma praia ou um vinho por um baseado, por exemplo - não que essas coisas se excluam, mas só para demonstrar a hierarquia das minhas preferências). Mas, enfim, generalização é isto, você pressupor que uma pessoa em quem você viu a característica A vai apresentar necessariamente a característica B, mesmo que você não tenha visto a característica B, só a A. Isso é uma maneira de criar um preconceito (tomara que seja a única).

O meu preconceito reverso consiste em generalizar as pessoas que têm algum tipo de preconceito contra mim, e pensar que sempre o mesmo tipo de pessoas terá preconceito contra mim. Nota: os preconceitos que pesam contra mim não são, de maneira geral, os preconceitos mais difundidos socialmente; muita gente acha que sou veado, por exemplo, e isso não me incomoda, é até um elogio de certa maneira, e minha única preocupação é que alguma garota que porventura esteja afim de mim não o diga porque pense "ah, o cara é gay, nem vou tentar", mas também não esquento muito com isso; me refiro a outros preconceitos que não vou mencionar (aquele mencionado ali em cima é só um exemplo da minha adolescência, pré-adolescência, aquele período). Quer dizer, eu, que sou às vezes rotulado por algumas pessoas, "coleciono" as características delas e pressuponho que outras com características semelhantes vão me rotular, e já me sinto, por isso, rotulado de antemão, sem que necessariamente elas tenham me rotulado (porque eu geralmente não pergunto se me rotularam).

É um preconceito, como qualquer outro, e, além disso, influi de maneira negativa nas minhas relações com as pessoas. Como qualquer outro preconceito, aliás.