Divagar divagarinho

Liberdade - essa palavra que o sonho humano alimenta: que não há ninguém que explique, e ninguém que não entenda!
Visite:  ||  Instituto Humanitas Unisinos - IHU.  ||  Religión Digital  ||  Site do Vaticano  ||  Agencia Informativa Latinoamericana S.A.  ||  Radio Reloj  || 
Creative Commons License Powered by Blogger

Arquivo de postagens: dezembro 2006   janeiro 2007   fevereiro 2007   março 2007   abril 2007   maio 2007   junho 2007   julho 2007   agosto 2007   setembro 2007   outubro 2007   novembro 2007   dezembro 2007   janeiro 2008   fevereiro 2008   março 2008   abril 2008   junho 2008   julho 2008   agosto 2008   setembro 2008   outubro 2008   novembro 2008   fevereiro 2009   abril 2009   maio 2009   fevereiro 2011   março 2011   junho 2011   março 2017   abril 2017   maio 2017   junho 2017   outubro 2017   abril 2018   agosto 2018   setembro 2018   janeiro 2019   abril 2019   maio 2019   junho 2019   setembro 2019   novembro 2019   dezembro 2019   janeiro 2020   fevereiro 2020   julho 2020   agosto 2020   setembro 2020   outubro 2020  



10 de setembro de 2018

 

A Bolha

Metade do que eu já vivi foi só imaginação, e se eu tivesse algum talento literário pelo menos teria uma carreira - que talvez não fosse de sucesso, mas eu preferia ser um escritor medíocre do que não ser um escritor.
O mais interessante é que tudo isto não tem nada a ver com o que eu ia escrever, exceto a parte da imaginação.

Um dos assuntos recorrentes do meu imaginário são as reformas que a Igreja não promoveu: ordenação feminina, comunhão de divorciados, casamento homossexual, etc.

Normalmente eu imagino como este tipo de mudanças podem ser compatíveis com a doutrina católica, e também se são compatíveis - o que poderia ser, como de fato já foi um dia, um exercício de orgulho, pois eu pensava como se eu decidisse essas coisas, mas que se transformou num exercício (difícil) de humildade (que acontece depois, enquanto eu lembro a mim mesmo que são decisões que não cabem a mim, embora isto não me exima de pensar sobre os assuntos).

Geralmente eu concluo que das duas, uma: ou estas reformas nunca irão acontecer, ou irão, mss este não é o momento adequado; como Deus sabe o que faz, se não ocorreram é porque ele não quer que ocorram (seja agora, seja nunca), e como Ele não me faz confidências, eu só posso especular e mr esforçar para manter minhas especulações dentro do seu extrato especulativo (o que é óbvio, mas é difícil e este é o exercício de humildade).

A minha mais recente teoria/especulação é a seguinte:

Não importa, talvez porque não adiante, reformas na doutrina católica enquanto nós católicos vivermos dentro de uma bolha de virtuosidade cristã.

Eu vou na missa todo domingo, rezo alguma coisa todos os dias, mantenho o celibato há (pouco) mais de um ano e leio a Bíblia diariamente, mas tudo isto não deveria me dar a sensação de segurança que, no fim das contas, isto tudo me dá. Eu frequentemente me lembro, ou sou lembrado, de que tudo isto, que eu devo manter, não me coloca em uma posição privilegiada em relação "aos pecadores" (segue uma lista de motivos, porque eu adoro listas):

- porque quem me ([pronome] nos) salvou foi Cristo, e não minhas boas ações
- porque mesmo as minhas boas ações podem estar impregnadas de erros (quem garante que o pacote de bolachas que eu comprei pro cara que me pediu comida na rua não vai virar moeda de troca na biqueira, enquanto que o outro, pra quem eu disse que eu não tinha nada, realmente fosse comer as bolachas e nem fosse usuário?)
- os pecados que eu evito, os evito graças a Cristo, e não aos meus méritos (eu só giro a chave do carro, Deus é quem liga o motor e depois conduz o carro, e Deus sabe como é difícil pra mim até mesmo girar esta chave...)
- eu precisei aceitar Cristo na minha vida para fazer as coisas que a maioria das pessoas faz sem precisar rezar todos os dias e ir na missa todo o Domingo (imagino as coisas incríveis que essas pessoas fariam se fossem um pouco mais religiosas, considerando o quanto já são incríveis sem estar comprometidas com Cristo)
- mesmo os pecados que eu evito, ainda permanece um certo impulso para cometê-los; o que mais me incomoda nisto (além da incômoda batalha contra alguns impulsos) é ver o quanto me falta aceitar de coração o que eu já aceitei racionalmente ("na volta do barco é que [a gente] sente o quanto deixou de cumprir"), e é este item que encerra esta lista e põe o texto de volta no rumo da teoria/especulação.

Eu não sei se (e não acho que) nem todos nem a maioria dos católicos padeçam dos males do último item da lista, mas tenho a sensação de que uma boa parte de nós (universo "pesquisado": a internet) viva como uma comunidade dos justos de Deus.
Homossexualidade é pecado, aborto também - mas que moral eu tenho de apontar mesmo estes pecados nos outros? "Ah, mas o pecado deve ser denunciado" está certo, mas porque concentrar as denúncias na homossexualidade e não na promiscuidade que impera na heterossexualidade?

Eu, por exemplo, já fui mais promíscuo em todas as minhas (forever alone - poucas) relações (hetero) sexuais do que o que eu sei que fizeram a maioria dos homossexuais que eu conheci.

Como eu, que tudo o que faço pela minha filha é mandar dinheiro pra mãe dela, posso apontar o dedo para os pecados dela (a mãe) quando é ela quem cuida - todos os dias, o tempo todo - da menina tal e qual Deus cuida de todos nós? O dia em que a minha filha me perguntar se Deus sempre está conosco, o melhor exemplo que eu vou ter para dar vai ser a mãe dela ("olha minha filha, se a mamãe que é só uma pessoa como todo mundo fica o tempo todo contigo, quanto mais Deus que é Todo-Poderoso etc.") e não eu, que, exceto o fato de não ser ordenado (um fato gigantesco, é verdade), poderia rezar uma missa de olhos vendados com um pé nas costas (espero nunca precisar: rezar uma missa, nem ter os olhos vendados nem os pés nas costas).
O que eu estou tentando exemplificar a partir de mim é que se nem os santos canonizados vivem em um pedestal (o que fica em pedestais são obras de arte representando estes santos), quanto mais nós, que ainda gememos e choramos neste vale de lágrimas (quem dera fosse só uma metáfora) podemos nos colocar sobre pedestais.

Assim como eu acho que esta histeria coletiva cristã anti-aborto-lgbt-feminismo-etc mascara mais pecados do que aqueles que pretende combater, também acho que a histeria anti-cristianismo-opusdei-igrejacatólica-etc está errada: são duas histerias se retro-alimentando enquanto que tanto o pecado quanto as inustiças sociais continuam se disseminando (inclusive em projetos de governo).

Eu, particularmente, tento todos os dias estourar minha bolha de virtuosidade pessoal (que muitas vezes estoura à minha revelia), e acho que todos estes formadores de opinião católicos poderiam dedicar uma parte de suas inteligências para ver se no meio de todo o joio que estão queimando, não tem uma quantidade ainda maior de trigo (eu ia escrever mais, mas eu gostei tanto da frase anterior que vou encerrar este texto aqui, para fechá-lo com - o que eu acho que foi uma - chave de ouro).

Comments: Postar um comentário



<< Home