Liberdade - essa palavra que o sonho humano alimenta: que não há ninguém que explique, e ninguém que não entenda!
Minha opinião sobre a notícia abaixo:
tendo em vista a pior coisa que se possa dizer do ex-marido que fez isso, ainda assim pior está o casal: uma morta, e a outra viúva, assustada, agredida (por mais que talvez ela nem tenha sido tocada por ele - o que eu duvido - uma pessoa pode ser violentamente agredida mesmo sem o menor contato físico), fragilizada, etc. E sem a pessoa que ela gosta.
Mas o cara é medíocre. É interessante imaginar o que ele pensa, para ver o quão medíocre ele é.
A mulher é DELE. A partir de determinado momento, ele declarou a posse sobre ela. Ponto 1.
Ele é um homem. Se uma pessoa é X, significa que ela deve adequar-se a X - sendo homem, portanto, ele deve adequar-se a sua virilidade. Ser homem, para ele, é, antes de mais nada, ter o direito de posse sobre uma mulher - um direito dos homens. Quer dizer, não é que ELE possa ter ela, ele administra, com exclusividade, uma propriedade do gênero dele. Assim, ele representa o XY, digamos, e precisa fazer jus a essa sua masculinidade. "Fazer jus a essa masculinidade" implica, possivelmente, várias coisas, mas com certeza, dentre elas, implica em possuir uma mulher na medida em que isso é um direito masculino. Ponto 2.
A mulher largou dele. Imagine a frustração dele. Quando lhe roubam alguma coisa, você se volta contra quem o roubou. Mas e quando suas propriedades fogem aos seu domínio - sua mesinha de centro declarando que você não manda nela, por exemplo - contra quem você se volta? Contra as suas propriedades. Se você considera uma pessoa sua propriedade, bem, assim como você tem o direito de quebrar um copo seu e inutilizá-lo, você tem o direito de quebrar o que é seu. Mas ele, provavelmente, passou por algo pior do que a frustração de ter perdido o domínio sobre sua propriedade.
Sabe-se lá como ele encontrou a mulher dentro de um galpão abandonado. Mas encontrou. E, além de deparar-se com a insubordinação de seu bem mais precioso, ainda por cima tomou as dores de sua classe - afinal de contas, foi uma dupla insubordinação, contra ele próprio, largando-o, e contra o direito masculin de posse sobre as mulheres, ficando com uma mulher. Se fosse uma ofensa apenas contra ele, tlavez ele pudesse relevar, "permitir" que ela fugisse ao domínio dele. Mas tratava-se de desdenhá-lo duas vezes: ele mesmo e sua masculinidade. E a masculinidade não pertence a ele - disseram que ser homem era ter uma mulher, e que ele deve ser Homem. Aí - ofendendo seu bando - ele teve de dar um jeito. Sendo um Homem Bom, ele não descarregou sua raivasobre o seu maior bem - afinal, ela ainda pertence a ele ainda, ele apenas deu-lhe permissão para afastar-se. Ele descarregou sua raiva na corruptora que afastou sua ex-mulher da relação correta - com homens. Uma mulher assim, que subverte a ordem e os princípios fundamentais da sociedade, merece morrer. Não morrer, não que a morte seja o que ele queria. Mas, tendo roubado dele dois bens tão valiosos - a mulher e o respeito ao Homem ("Homem" nos termos dele) - ela precisava pagar com pelo menos uma coisa igualmente valiosa: por acaso foi sua vida.
Trata-se de uma questão de valores. Valores esses que são toscos, pelo menos par mim. Mas ainda por cima, vem o fascismo: as outras pessoas precisam viver segundo os valores dele - na opinião dele - nem que tenham que ser obrigadas a isso. Aquele casal precisava agir segundo o que ele achava correto.
A mediocridade do cara, para mim, está nesse sistema de valores, primeiro: ele depende de alguém que seja submisso. Segundo: são valores que passaram para ele, sobre os quais ele não tem o menor senso crítico - ele nunca se perguntou se poderia agir de outra maneira. Terceiro: ele precisa firmar-se como aquilo que ele quer ser (no caso, Homem) mediante o reconhecimento dos outros, e sua vida torna-se insuportável se alguém - como as duas mulheres - não reconhece isso.
Uma das coisas que eu acho mais terríveis é uma pessoa não conseguir enxergar-se a si mesma. E essa é uma coisa que ele faz bem: dentro da mediocridade dele, ele deve estar orgulhoso de ter agido como um homem quando precisou.
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Claro que eu não posso afirmar o que se passa na cabeça de uma criatura assim. Mas, além do terror que uma notícia dessas me dá (e contra esse terror ninguém luta com tanto afinco como quanto luta contra, por exemplo, os terroristas do Al Quaeda), e ter que admitir que não sei se esses foram mesmo os motivos dele, o que é pior nessa minha opinião aí de cima é que muitas pessoas pensam dessa maneira, e se não esfaqueiam as pessoas, praticam outros tipos de violências em diferentes níveis, muitas vezes sob a proteção de coisas como costumes, etiquetas, tradições e coisas assim.