Divagar divagarinho

Liberdade - essa palavra que o sonho humano alimenta: que não há ninguém que explique, e ninguém que não entenda!

22/03/2007

 

transgressão e linguagem

Minha opinião pode ser um pouco agressiva, mas eu não vejo nenhum tipo de "revolução" ou "revolta" na literatura atual.
Além de agressiva, minha opinião pode muito bem ser desinformada, porque eu não compro um décimo do que é mais acessível, e leio menos do que isso, de toda a literatura que é lançada.

Mas, alguém escreve um livro com meia dúzia de descrições picantes, e é um livro "revoltado". Outra pessoa vai e critica Cuba, ou os EUA, ou algum país da Europa, ou qualquer coisa assim, e é um livro "corajoso". Mais alguém lança um livro no estilo Harry Potter, como O Código Da Vinci ou qualquer coisa do Paulo Coelho, e é "uauuu!!". Adoro Harry Potter, mas também adoro fumar e Harry Potter está para literatura como cigarro está para saúde.

Literatura transgressora é outra coisa. E nem precisa ser transgressora. Precisa ser corajosa de verdade. Claro, eu compreendo que uma pessoa que queira escrever um livro queira ganhar dinheiro com esse livro. Nesse sentido, Dan Brown, Paulo Coelho, J. K. Rowling são perfeitos. Vivem de escrever. Eu também queria. Mas é porcaria.

Literatura corajosa é literatura que transgride - oh, que novidade - o mercado.

Em geral, aliás, a maior transgressão possível é contra o mercado e, falando com sinceridade, detesto o mercado, mas quero muito ganhar dinheiro. Me apresente outra possibilidade que eu vou correndo ver se dá certo. Mas só renuncio ao meu salário, à exploração econômica a que me submeto, quando ver que a outra possibilidade dá mesmo certo, e não "pode dar", "dará", ou "tem tudo para dar certo".
Eu acho muita graça dos punks, malvadões anti-capitalistas, que usam roupas de couro cravejadas de metais que eu, parte da massa alienada que sou, não compro com o meu salário. Me prove que não são os pais dos punks que pagam a roupa deles, que eu chamo esse pessoal de punk. É fácil ser anti-capitalista quando se tem o capital dos outros por trás.

Uma transgressão literária é fazer um livro fora do padrão. E isso eu raramente encontro. Tudo bem, é uma questão de gosto. Mas a maioria dos livros que leio são detestáveis. Quase sempre as mesmas histórias, repetições atualizadas de Shakespeare, da literatura francesa, Cervantes, e outras coisas menos cotadas. Claro, são coisas bem-feitas: Harry Potter não é uma cópia de somente um romance, nem reproduz somente um estilo. Dan Brown não é simplesmente uma Agatha Christie atualizada. Mas é tudo mais do mesmo.

E, tudo bem, já li muita porcaria que me pareceu legal. Basta citar Harry Potter.

Mas só me irrita que as pessoas vendam transgressão onde não tem nem cheiro de pólvora. Ou pensem que transgressão é pornozão barato. Nada contra nem a favor de pornozão barato, mas não me diga que descrições "quentes" são transgressões. Masturbação é mais transgressora do que isso.

***
Nada a ver com o assunto, mas é que eu estou assistindo Jornal Nacional enquanto escrevo: pobre papa... Chamam-no de nazista, conservador, tosco, velho rabugento idiota, enquanto ele é apenas um incompreendido, como qualquer adolescente que se tranca no quarto para ouvir Sepultura ou Metallica para expressar sua perplexidade diante deste mundo mau e feio. O pobre alemão fala, o povo entende mal e, coitado, as pessoas ficam fazendo cara feia para ele. Primeiro foi quando ele falou mal dos muçulmanos: ninguém entendeu que ele apenas citava alguém que falava mal dos irmãos no monoteísmo, e também ninguém subentendeu o óbvio, que deveria-se compreender suas palavras como se fossem acompanhadas da legenda "a opinião dos autores citados não reflete necessariamente as opiniões desse pobre Servo de Deus". Agora, ficam dizendo por aí que ele chamou casais que se casam novamente de "praga". Erro de tradução, claro. A palavra que ele utilizou em latim pode ter o sentido de "praga", mas seu uso mais comum é no sentido de "ferida aberta".
Gente de má vontade para com o Sucessor de Pedro, como eu, diria que a) uma "ferida aberta", se não é uma praga, no mínimo é algo nocivo que deve ser curado e b) como sempre, tudo é um problema de linguagem. Se mandarem você se fuder, por exemplo, não cometa o erro de linguagem de pensar que é uma ofensa: essa pessoa está apenas recomendando que você se ame mais, acaricie-se mais, e se foda mesmo, já que fuder é uma coisa boa e ninguém melhor do que você para se dar esse prazer. A próxima citação do papa deveria ser "Cito Chaves do Oito: 'Foi sem querer querendo, eu só quis dizer..."

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