Divagar divagarinho

Liberdade - essa palavra que o sonho humano alimenta: que não há ninguém que explique, e ninguém que não entenda!

31/03/2007

 

Filmes doces

Existe, decerto, um universo feminino e um masculino, cada um
supostamente inerente à condição biológica de cada pessoa. Trato isto
como uma suposição por não acreditar muito, mas também não dou
descrédito a esta hipótese porque não é muito provável que toda a
humanidade esteja errada e eu não. Fico assim, na dúvida, tomando uma
coca-cola.



Mas sei que há uma cultura feminina e uma masculina.
Acho difícil falar em cultura, porque sempre que tento dizer "o que é
cultura?" não respondo satisfatoriamente. Mas trata-se de culturas.





A
cultura masculina acho um tanto pobre - eu também tenho meus
preconceitos. Conheço homens muito legais e interessantes, na minha
opinião estrangeiros na cultura masculina, mas esses poucos exemplares
não salvam o grupo todo. Conheço, também, mulheres pífias e sem
interesse, mas elas também não invalidam toda a cultura feminina. Que,
na minha opinião, é muito rica e interessante.



Provavelmente,
trata-se de uma questão de gosto. Não é porque eu goste que as outras
pessoas têm de gostar. Mas se trata do meu gosto.



Também não
contraponho uma cultura feminina a uma masculina. Não gosto da cultura
feminina em detrimento da masculina - eu poderia, por exemplo, gostar
de ambs, ou de nenhuma. Gosto de uma não por não gostar de outra, mas
sim de maneira positiva.



E, o mais estranho: as culturas se
interpolam. Não falo somente das culturas feminina e masculina:
culturas nacionais, culturas regionais, culturas profissionais,
culturas intelectuais, culturas gastronômicas, dentro de cada categoria
existem muitas culturas diferentes que se interpolam, e essas culturas
também interpolam-se com outras das outras categorias. Por isso, ou por
incapacidade minha, eu não consigo determinar de maneira objetiva o que
é próprio da cultura feminina.



Não é simples como dizer, por
exemplo, que livros femininos são os livros escritos por mulheres.
Frankenstein é muito distinto de Lado B - Histórias de Mulheres, ou do
Romanceiro da Inconfidência. Se fosse para seguir esta lógica, o gênero
"terror" seria algo próprio da cultura feminina, seria literatura
feminina - coisa que não acredito existir, a literatura de gênero. Pode
ser que determinadas obras condicionem-se pelo olhar de gênero de quem
as produziu, mas isso não configura algo como uma escola, ou um tipo de
arte.





E, claro, existe uma certa empatia de gênero. Eu fico pensando em
amigas minhas que, andando num grupo de pessoas onde a maioria são
homens (duas mulheres e três homens, por exemplo), acabam tendo
atitudes que geralmente não tem, mas que naquele momento são fruto
dessa empatia - quer dizer, conheço meninas que detestam coisas
"fofas", mas saem correndo para ver Hello Kitties porque a outra menina
teve um ataque de fofura ao ver bonecos da Hello Kittie na vitrine.
Isso somente vira uma coisa medíocre, na minha opinião, quando se tenta
transferir esse tipo de empatia para coisas como literatura ou outras
artes. Frida Kahlo tem mais temas femininos do que Magritte, mas a
pintura dela não é mais "feminina", ou a de Magritte mais "masculina".





Enfim, trata-se de um certo tipo de ambiente feminino que eu gosto. E
não falo de decoração bem-feita, casa arrumada ou capas de caderno
cor-de-rosa.





Mas tudo isso para dizer que o filme Coisas que você pode dizer só de
olhar para ela é o tipo de filme que eu gosto. Não é um filme femino.
Nem masculino. Foi escrito por um homem (não sei o nome, mas o cara é
filho do Gabriel García Marquez). Um filme encantador. O filme gira em
torno do amor, para variar. Não que eu não goste, mas sinto falta de
filmes onde a protagonista é uma mulher (ou o pretenso "universo
feminino") e o tema do filme é algo diferente do amor, como Xena ou
Gilmore Girls.





Mas Coisas que você pode dizer só de olhar para ela é encantador. Gosto
de filmes com capítulos (tipo Kill Bill), e filmes assim, múltiplos.
Porque o filme não fala de uma mulher, mas apresenta muitas mulheres em
muitas situações diferentes.





Só que não são as situações em si, e sim as coisas emocionais do filme quie são legais.





Gosto desses filmes com silêncios, meio paradões. Em uma das cenas, uma
personagem pergunta a um colega se os outros homens do banco têm
fantasias sexuais com ela. Eles ficam se olhando em silêncio até que
ele responda, e dá tempo de perceber claramente a perplexidade do
colega dela. Ou, em outra, a cartomante fica meia hora falando dos
passarinhos, e os passarinhos passam a fazer parte do filme.





Enfim, o filme é ótimo.



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